segunda-feira, 5 de outubro de 2009


RÁDIO NO CIBERESPAÇO: DO HIPERTEXTO AO EXTRATEXTUAL - Artigo Completo_Download pdf


O objetivo do presente artigo é verificar analiticamente as aplicações da linguagem radiofônica no ciberespaço, bem como as alterações/adaptações da mesma neste ambiente partilhado por cérebros e máquinas e está dividido em dois momentos. O primeiro visa categorizar comparativamente as intermodalidades das quais se valem o rádio no espaço reticular, a saber: hipertextos circunscritos, performances de gosto e ecossistemas sócio-técnicos. Em um segundo momento vamos interpretar a prospecção do rádio em um ambiente que, da transmissão sem fios de outrora, na contemporaneidade extrapola o hipertexto e o mero compartilhamento de arquivos para apostar na interface em seu lato sensu. Para tal tarefa, faremos uso do referencial teórico-metodológico que propõe o deslocamento dos meios às mediações, entronizando desta forma a linguagem radiofônica exposta no ciberespaço não como premissa de um aparato tecnológico, mas sim como constitutiva dos novos modos de relação do público com o veículo.



quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Self-voyeurism


Hímen transposto, a entropia reina absoluta. Entre o oxímoro que nega o dito e a doblez que acrescenta ardilosamente algo ao óbvio, tento caminhar. À margem da presunção, pretensão, vaidade, orgulho, pedantismo, provincianismo, ignorância, tirania, ciúme... ou marginalizado por estes traços tão recorrentes? Quiçá o tempo possa elucidar questão de ontologia tão profunda quanto passível de ser notada claramente por um observador mais atento. Busco emitir apenas os sons que guardo em mim, pois ao passo que as células se movimentam emitem vibrações/sons e delas(es) não se pode fugir. E cá estamos, contraditoriamente como sempre, vomitando idiossincrasias a um interlocutor sem cara, sem voz. Gostaria que você estivesse aqui.
Paulinho da Viola, reconhecidamente gênio da canção, interpreta lindamente algo que ele mesmo escreveu como um bom leitor de si mesmo que é: "sem melodia ou palavra pra não perder o valor..." (Coisas do mundo minha nêga, originalmente lançada no play Memórias Cantando de 76). Sentença, paradoxalmente, de altíssimo teor semântico, pois reitera a limitação de nossa fruição icônica. A própria melodia, mesmo desatrelada do oral-verbal, da letra, entrega intencionalidades que invariavelmente não condizem com as pensadas pelo autor. O que dizer das palavras? A estas, reservo Fernando Pessoa: "É fácil trocar as palavras, difícil é interpretar os silêncios!" Mesmo que nos esforcemos para buscar a terminologia correta, que carregue consigo o sentido exato... em vão. Mesmo a linguagem representativa/icônica dos sistemas operacionais/informáticos, que traduziram em imagens as mensagens do mediador universal do conhecimento, o número - e seu código binário -, ao menos arrisca-se na aventura de desvendar os descaminhos anímicos e psíquicos do ser.
Somos anti-naturais. Esta mãe segue seu fluxo intacta apesar de nossas ingerências. As formigas, abelhas e elefantes não trabalham. Suas atividades são imanentes. Subsistentes. Nós somos os únicos seres que trabalham abnegados para explodir a mais mais-valia e implodirmo-nos em um niilismo cada mais patente. Vidas desgostosas, sem romance, sem poesia. E aquele que clama por um fio de transcendência é duramente castigado, impiedosamente rotulado: um pessimista, um mal-amado! Daí a frase de Paulinho elevar-se em relevância: a harmonia(musical), suprimida na sentença, seria o campo fértil para a conotação, para o onírico, para o tempo suspenso e, sobretudo, para o sentido do que eu gostaria de te dizer todos os dias, todas as horas e minutos. Para o intangível. Ainda nos resta o self-voyeurism. Conceito auto-explicativo, por ser etimologicamente óbvio, mas que pressupõe um distanciamento do objeto de análise. Você. Eu precisamente. Nós longe de nós.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Strange Fruit


Clementina de Jesus

Clementina era de Jesus mas também era da Silva. A cara preta do Brasil. Empregada doméstica, seu pai era violeiro e a mãe, de sangue e de santo, entoava pontos, ladainhas, jongos e partidos. Quelé, alcunha que recebera ainda na infância, transpirava cultura africana e a adolescência em Oswaldo Cruz foi marcada pela participação no bloco carnavalesco As Moreninhas e pelas apresentações nas rodas de samba da Portela, agremiação que teve que deixar de freqüentar anos mais tarde por conta de seu casamento com um tradicional mangueirense da época, Albino Pé Grande. Como se a razão, geográfica, machista, imperativa ou não, pudesse impedir um grande amor. Bobagem.

Só em 64, depois de uma vida limpando e ordenando os nobres lares da zona zul carioca, o poeta e compositor Hermínio Bello de Carvalho a convidou para fazer um concerto ao lado do violonista Turíbio Santos, numa aventura já incensada àquela altura, que objetivava reunir manifestações musicais populares e eruditas, uma performance crossover. Ela aceitou, mas o público refutou e o projeto minguou. Um ano depois se daria o lançamento definitivo de Quelé como cantora. Nascia uma sexagenária estrela. Tudo a seu tempo. E de cara, dividia palco com parceiros contumazes de Hermínio: Paulinho da Viola, Elton Medeiros e Araci Côrtes.

O samba-homenagem composto por Medeiros intitulado Clementina, cadê você?, arremessa–nos ao abismo da dúvida. E para amesquinhar o sofrer, tomamos a liberdade de responder ao autor e a todos os que compartilham da mesma: Clementina deve estar em Dacar, no Senegal, cidade que abrigou sua grave voz no Festival de Arte Negra, realizado por lá em 66, um marco. Pois se D`África vem, Pr`África retorna. Seu lamento ainda ecoa, ressoa na semente do samba, benguelê de Angola, onde o boi não berra, sofre sem queixumes e aguarda a sua vez.

Abaixo, Hermínio declara toda a sua devoção a quem chamava de Pixinguinha de rendas e introduz um samba que compôs em parceria com o portelense Paulinho. Sei lá, mangueira.

sábado, 22 de agosto de 2009

Strange Fruit

Cartola



Agenor não. Muito prazer, Angenor de Oliveira, seu criado. Satisfação. Sou nascido no bairro no Catete, mas antes de completar minha primeira década de poesia mudei-me para as Laranjeiras. Logo passei a freqüentar o morro, lugar de gente simples, trabalhadeira, de onde não mais me afastaria. Até tentei estudar, mas o cavaco e suas minguadas quatro cordas, além do trigueiro violão, só permitiram que eu terminasse o primeiro grau.


De mais a mais, quando tinha quinze anos minha santa mãezinha veio a falecer. Gota d’água para a boemia. Minha profissão? Tipógrafo, lavador de carros, pedreiro. Aliás, das obras dos homens veio este meu apelido. Cartola para proteger o cabelo penteado do cimento que suja e o endurece ainda mais. Mas o que gosto mesmo é de samba. Ao lado de meu mais constante parceiro – e os verdadeiros se contam nos dedos de uma mão – Carlos Cachaça, fundei o Bloco dos Arengueiros, que mais tarde, contando com a força da rapaziada dos outros blocos da comunidade, transformara-se na mais importante escola de samba do mundo – pois se é do Brasil é do mundo – Estação Primeira de Mangueira, minha paixão. E veja você, fiz questão de dar nome e cores, magia verde e rosa.


Já fiz muita coisa nessa minha vida, até de radialista já joguei. Advinha qual era o nome do meu programa? A voz do morro – homônimo do grupo que formamos anos depois, Zé Keti, Nelson Cavaquinho, Elton Medeiros e eu – no qual só eram apresentados sambas inéditos, ainda sem título. Os nomes eram escolhidos pela audiência. Tudo idéia dela. Impossível passar por mim e não ver o meu amor. Eusébia Silva do Nascimento, a minha Zica. Daí o nome Zicartola. A humilde bodega que montamos serviu de palco para o namoro entre morro e asfalto depois que aquela moça, a Nara Leão, passou a freqüentar as cercanias. A malandragem agradece.


Mesmo com um sem-número de sambas compostos fui gravar meu primeiro disco solo eu já tinha 66. Tem nada não, foi até bom, o tempo é senhor. Hoje choro de alegria e não disfarço, pois minhas cordas de aço hão de fazer o sol brilhar mais uma vez. Corra o olha o céu.




terça-feira, 18 de agosto de 2009

Strange Fruit


Pixinguinha


Menino bom, Pizindim. Alfredo da Rocha Viana Filho cresceu ouvindo os genitores barbeiros do ainda guri chorinho em sua casa. Seu pai, músico, tinha por costume reunir os convivas das redondezas, Irineu de Almeida, Quincas Laranjeiras, Pinguça, Cândido Trombone e outros para aquela curtinha, alvinha do bate-papo. O garoto Pixinguinha e seus irmãos apenas observavam. Crianças são sugestionadas pelo meio em que vivem e suas aptidões seguem o fluxo. O texto musical transformara a família de seu Alfredão em cordas, sopros, batuques; teatros, circos e cinema.

Apresentações na Lapa de baixo com apenas 16 anos além de performances nas grandes emissoras radiofônicas da época eram comuns, mas nada como o cordão dos carnavais e as charangas das quais fazia parte, animando os foliões que gentilmente acotovelavam-se em tempos de folguedo popular de fato.

Chico Dunga, como também era chamado, teve a oportunidade de ser patrocinado por um milionário da época, Orlando Guinle. O bacana bancou turnê ao exterior dos Oito Batutas, grupo que Pixinga formara com Donga, China, Nelson Alves e outros figurões que perpetuariam a linguagem do samba-choro que hoje conhecemos. Apresentaram-se em importantes nações européias com direito a temporada de seis meses em Paris. Consagração e muito trabalho os esperavam no Brasil, pra onde voltariam e de onde nunca mais sairiam. Da infância humilde em Catumbi ao suntuoso teatro Dancing Schérazade em Paris, Pixinguinha, rebento de ventre livre, traçou sua trajetória com a singeleza do verso mais afamado do tema mais executado de nosso repertório popular, Carinhoso, que foi cantado em coro por duas mil vozes em seu sepultamento, a 17 de fevereiro de 1973: “Meu coração, não sei porquê, bate feliz, quando te vê...”

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Self-voyeurism

Hímen transposto - não duvido mais dos blogueiros, considero-me um -, a entropia reina absoluta. Entre o oxímoro que nega o dito e a doblez que acrescenta ardilosamente algo ao óbvio, tento caminhar. À margem da presunção, pretensão, vaidade, orgulho, pedantismo, provincianismo, ignorância, tirania, ciúme... ou marginalizado por estes traços tão recorrentes? Quiçá o tempo possa elucidar questão de ontologia tão profunda quanto passível de ser notada claramente por um observador mais atento. Busco emitir apenas os sons que guardo em mim, pois ao passo que as células se movimentam emitem vibrações/sons e delas(es) não se pode fugir. E cá estamos, contraditoriamente como sempre, vomitando idiossincrasias a um interlocutor sem cara, sem voz. Gostaria que você estivesse aqui.

Paulinho da Viola, reconhecidamente gênio da canção, interpreta lindamente algo que ele mesmo escreveu como um bom leitor de si mesmo que é: "sem melodia ou palavra pra não perder o valor..." (Coisas do mundo minha nêga, originalmente lançada no play Memórias Cantando de 76). Sentença, paradoxalmente, de altíssimo teor semântico, pois reitera a limitação de nossa fruição icônica. A própria melodia, mesmo desatrelada do oral-verbal, da letra, entrega intencionalidades que invariavelmente não condizem com as pensadas pelo autor. O que dizer das palavras? A estas, reservo Fernando Pessoa: "É fácil trocar as palavras, difícil é interpretar os silêncios!" Mesmo que nos esforcemos para buscar a terminologia correta, que carregue consigo o sentido exato... em vão. Mesmo a linguagem representativa/icônica dos sistemas operacionais/informáticos, que traduziram em imagens as mensagens do mediador universal do conhecimento, o número - e seu código binário -, ao menos arrisca-se na aventura de desvendar os descaminhos anímicos e psíquicos do ser.

Somos anti-naturais. Esta mãe segue seu fluxo intacta apesar de nossas ingerências. As formigas, abelhas e elefantes não trabalham. Suas atividades são imanentes. Subsistentes. Nós somos os únicos seres que trabalham abnegados para explodir a mais mais-valia e implodirmo-nos em um niilismo cada mais patente. Vidas desgostosas, sem romance, sem poesia. E aquele que clama por um fio de transcendência é duramente castigado, impiedosamente rotulado: um pessimista, um mal-amado! Daí a frase de Paulinho elevar-se em relevância: a harmonia(musical), suprimida na sentença, seria o campo fértil para a conotação, para o onírico, para o tempo suspenso e, sobretudo, para o sentido do que eu gostaria de te dizer todos os dias, todas as horas e minutos. Para o intangível. Ainda nos resta o self-voyerism. Conceito auto-explicativo, por ser etimologicamente óbvio, mas que pressupõe um distanciamento do objeto de análise. Você. Eu precisamente. Nós longe de nós.

Paulo Padilha
Samba Deslocado Descolado Samba



De cara a capa traz um trocadilho. O nariz torce sozinho. Talvez seja sintoma dos espasmos anti-clichês que geralmente acometem os amantes de qualquer coisa quando se deparam com um. Mas este até que pintou com um certo ar vanguardista, ali, valendo-se do espaço gráfico como uma aventura planificada numa atmosfera quase concreta. O jogo cênico entregou logo que o som ali contido era samba, apesar de descolado, era também deslocado, felizmente deslocado. Coração e ouvidos abertos, mergulhemos na proposta de Paulo Padilha, baixista de ofício que neste projeto põe à prova quase vinte anos de carreira profissional voltando às raízes, ao violão, à composições instintivas escudadas por crônicas urbanas/cotidianas, amparadas pelo poder do groove essencialmente acústico imposto por violão, baixo e percussão. Célula sedimentada como força bruta do balanço brasil, criada pelo esquema novo de Ben nos idos de 60 e desenvolvida por outros tantos.
Neste Samba Deslocado Descolado Samba, seu terceiro disco de autor, o músico parece romper, ainda que circunstancialmente, com a rigidez da música instrumental brasileira e a disciplina que dela se exige, gênero para o qual contribuiu boa parte de sua trajetória atuando como baixista do grupo de paulistano Aquilo Del Disso que surgira com destaque nos 90 participando de festivais importantes mundo afora e tendo em sua discografia cinco álbuns lançados. No repertório, destacamos as primeiras faixas do play: “Bagunça” baseia-se em questionamentos pueris do tipo “se todo operário pode ser presidente por que o presidente não vira peão?”, ou ainda, “se até o crime tá organizado por que a minha vida tá uma bagunça?” e assim caminha, descontraída como um bom pagode de mesa regado a chá de macaco - como diria o mestre João Nogueira, referindo-se aos birinaites-. Depois, alternam-se matizes do samba. O samba-funk (“Love” e “Cabeça”), samba-de-breque em “Cobrador”, que escancara a relação a dois em caráter auto-biográfico. Também se destacam a versão para “Preconceito” de Wilson Batista e Marino Pinto, catapultada por João Gilberto, e a súplica por uma fatia do mainstream registrada na composição “Dia Santo Também”. Agora nos resta apertar o play de novo e deslocar nosso foco para a beleza da simplicidade presente no não-novo, no não-revolucionário, no mais verdadeiro.



Paulo Padilha_Bagunca | Online recorder

Maceo Parker
Roots & Grooves





A militância altruísta guiou o trabalho do saxofonista Maceo Parker ao longo de seus mais de 40 anos de carreira. Além de inocular nobres legados como a fidelidade ao SoulJazz, colaborou para a construção de linguagens-símbolo do gênero, sedimentadas por referências com as quais trabalhou como George Clinton, Bootsy Collins e a maior delas, James Brown.
Parker atua como bandleader desde o início dos 70, quando debutou em vôo solo com “Doing’ Their Own Thing”, amparado pela sugestiva All the king’s men, banda na qual figuravam seu irmão Melvin e o inseparável trombonista Fred Wesley, ambos egressos da banda de Mr. Dynamite. Hoje, à sua lista somam-se 17 álbuns solo.
No mais recente, o duplo ao vivo “Roots & Grooves”, o músico homenageia Ray Charles, executando – inclusive cantando – clássicos de sua trajetória como “Busted” e “Geórgia on my mind”, dividindo palco com a alemã WDR Big Band. Destaque para a versão vibrante de “Hit the road jack”. Como o título nos revela, depois das raízes, que venham os grooves! O segundo disco traz composições do saxofonista revitalizadas por novos arranjos. A impagável “Pass the peas” defendida como carro-chefe pela lendária “The J.B’s” nos 60, conta com os característicos vocais em uníssono, fecha o disco com 17 minutos de puro êxtase e rouba a cena.



Maceo Parker_Hit the road Jack | Online recorder

David “Fathead” Newman

DIAMONDHEAD






De Fat à Diamond. Notas, frases e compassos proferidos por sax e flauta fizeram a “head” do recém-falecido David Newman e de seus admiradores, elevando inclusive o status quo de sua alcunha. Iniciado no ofício pelo mentor de Charlie Parker, Buster Smith, Newman atuou em meados dos 50 no grupo de Ray Charles até ser apresentado ao mercado pelo mesmo no álbum Fathead: Ray Charles presents David Newman.

Dia 20 de janeiro último foi registrado o derradeiro sopro de vida do músico, que meses antes gravava Diamondhead, trabalho que conta com uma cozinha vigorosa, formada pelos jovens Peter Washington (baixo) e Yoron Israel (bateria), e com a perícia dos experientes Cedar Walton (piano) e Curtis Fuller (trombone). Amálgama geracional que deu ao álbum o equilíbrio necessário para defender temas autorais – como a faixa título que abre o disco e surpreende pela levada de nujazz, bem ao estilo do suíço Erik Truffaz – e standards downtempo como Skylark. Em grande fase, o trombone do sempre instigante Curtis Fuller fala alto na composição My Full House, criada por Fathead como se fosse um convite aos amigos para que jamais deixem de encher sua casa com boas vibrações, mesmo na sua ausência.




David "Fathead" Newman_Diamonhead | Music Upload

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Musica Ligeira

Avant-garde, linha de frente, vanguarda. Produções atemporais que preservem frescor inventivo e originalidade. Fonogramas que sustentem suas ambições, sejam elas humílimas ou superlativas, não obstante, intuitivamente guiadas por uma coerência textual: oral-verbal, melódica, harmônica, rítmica; e por uma necessária incongruência atmosférica, ambiental, ecossitêmica; por um deslocamento sônico que perpasse a mais-valia e a ludibrie, meta-lhe um drible de corpo e extraia dela o seu melhor: a legitimação, o direito de existir concedido pelo consumo que dela advém.
O ineditismo e a concessão para existir são exemplos de alguns dos conceitos que alicerçam os discursos construídos para cada edição desta produção. Há 5 anos no ar pelos 105,7 mhz da UnespFM - Bauru - SP (www.radio.unesp.br), tem por fim expor aos ouvintes a vibração do repertório popular, seus gêneros e movimentos. Clássicos, lançamentos e raridades do mercado fonográfico, bem como o perfil de seus personagens. Objetivando invariavelmente compreender a praxis criacional do artista e a periferia que lhe serve ou lhe servira de enredo para a construção de seus textos e como esta relação foi absorvida pela conjuntura mercadológica, tanto na contemporaneidade como em retrospecto.
No player, dois quadros que integram a produção:



Contra#tempo

Contra#tempo_Musica Ligeira Upload Music

Produção e apresentação: João Flávio Lima

domingo, 9 de agosto de 2009


Joyce

SHOW DOS 40 ANOS DE CARREIRA




Dentre as muitas que nela habitam há uma loba. Que toca, canta e compõe justamente pelo período que caracteriza um de seus alteregos. Ao lado de João Donato, Dori Caymmi, Leila Pinheiro e Mônica Salmaso, Joyce celebra em seu mais recente CD, gravado ao vivo, 40 anos de carreira. Nele passeia por clássicos de seu repertório como Mistérios, Samba de Mulher, Feminina, Clareana e ainda revela novas composições em parceria com Carlos Lyra em ...E Era Copacabana e com João Donato E passa o carrossel. A banda, que no trabalho atua com discrição, privilegiando a interpretação da artista, conta com o inseparável baterista Tutty Moreno, sempre dinâmico, Rodolfo Stroeter no contrabaixo e poderíamos sentir a ausência do sax e das flautas de Teco Cardoso não fosse a substituição à altura protagonizada pelo violonista Lula Galvão, que responde pelos improvisos, inversões, substituições de acordes e vernizes jazzísticos do projeto. Álbum celebração que soa por vezes psicanalítico, nostálgico até e que por fim homenageia aquela que reforça a condição de ser feminina em todo lugar, de ser loba e não abrir mão de seu chapeuzinho vermelho.



Joyce_Samba de Mulher | Online recorder

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Crime perfeito

Kutiman e a saga do pastiche reticular. Smashup, um meio. Genialidade, um fim.
Orquestrar as vozes mais díspares e torná-las uma. Ajustar tons, compassos, contratempos, linhas melódicas, rimas, solos; e a um só tempo sincronizá-los com imagens, compondo uma narrativa mosaicista guiada pela essência da arte bricolage. Um crime perfeito.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Self-voyeurism

Hímen transposto, a entropia reina absoluta. Entre o oxímoro que nega o dito e a doblez que acrescenta ardilosamente algo ao óbvio, tento caminhar. À margem da presunção, pretensão, vaidade, orgulho, pedantismo, provincianismo, ignorância, tirania, ciúme... ou marginalizado por estes traços tão recorrentes? Quiçá o tempo possa elucidar questão de ontologia tão profunda quanto passível de ser notada claramente por um observador mais atento. Busco emitir apenas os sons que guardo em mim, pois ao passo que as células se movimentam emitem vibrações/sons e delas(es) não se pode fugir. E cá estamos, contraditoriamente como sempre, vomitando idiossincrasias a um interlocutor sem cara, sem voz. Gostaria que você estivesse aqui.

Paulinho da Viola, reconhecidamente gênio da canção, interpreta lindamente algo que ele mesmo escreveu como um bom leitor de si mesmo que é: "sem melodia ou palavra pra não perder o valor..." (Coisas do mundo minha nêga, originalmente lançada no play Memórias Cantando de 76). Sentença, paradoxalmente, de altíssimo teor semântico, pois reitera a limitação de nossa fruição icônica. A própria melodia, mesmo desatrelada do oral-verbal, da letra, entrega intencionalidades que invariavelmente não condizem com as pensadas pelo autor. O que dizer das palavras? A estas, reservo Fernando Pessoa: "É fácil trocar as palavras, difícil é interpretar os silêncios!" Mesmo que nos esforcemos para buscar a terminologia correta, que carregue consigo o sentido exato... em vão. Mesmo a linguagem representativa/icônica dos sistemas operacionais/informáticos, que traduziram em imagens as mensagens do mediador universal do conhecimento, o número - e seu código binário -, ao menos arrisca-se na aventura de desvendar os descaminhos anímicos e psíquicos do ser.

Somos anti-naturais. Esta mãe segue seu fluxo intacta apesar de nossas ingerências. As formigas, abelhas e elefantes não trabalham. Suas atividades são imanentes. Subsistentes. Nós somos os únicos seres que trabalham abnegados para explodir a mais mais-valia e implodirmo-nos em um niilismo cada mais patente. Vidas desgostosas, sem romance, sem poesia. E aquele que clama por um fio de transcendência é duramente castigado, impiedosamente rotulado: um pessimista, um mal-amado! Daí a frase de Paulinho elevar-se em relevância: a harmonia(musical), suprimida na sentença, seria o campo fértil para a conotação, para o onírico, para o tempo suspenso e, sobretudo, para o sentido do que eu gostaria de te dizer todos os dias, todas as horas e minutos. Para o intangível.

Ainda nos resta o self-voyerism. Conceito auto-explicativo, por ser etimologicamente óbvio, mas que pressupõe um distanciamento do objeto de análise. Você. Eu precisamente. Nós longe de nós.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

My 1st post




À distância os observo. Classifico tamanha exposição como, no mínimo, desnecessária. A esfera pública degradada em seu strictu sensu espacial nos convida ao arrefecimento social e ao consequente distanciamento da comunicação face a face. Mas, ainda assim, vejo o blogueiro como um solitário, psicaliticamente minorizado, que não se vê representado e logo pressionado a extravasar frustações, como se estivesse em um confessionário às avessas, num parlatório sem quorum ou ainda, num divã, verbalizando idiossincrasias a um interlocutor invisível. Neste primeiro post - mais um neologismo globalizante que integra um lexico que sustenta esta interface de códigos linguísticos que é a grande rede...tenho muito a incorporar ao meu pobre lexico lusofônico e instrumental - depois de convecido pela minha inconsciência, sinto-me um diletante debutando, com direito a friozinho na barriga e tudo, alocado em um outro estágio da minha psique, no qual além de assumir a existência do alterego da representação social, presente neste grande palco hiperreal que se transformou nossas vidas, posso expor(-me) impressões pessoais verbalizando-as sob a forma de signos linguisticos. O que se configura em exercício não raras vezes instigante e, ainda, despir-me da intenção de magoar, impressionar, decepcionar, dissimular ou atingir ninguém. Estou maravilhado com esta possibilidade.


Não que não haja uma série de seres interessados exclusivamente em subjugar a riqueza desta experiência, reduzindo-a à celebrização de sua personalidade e de seus gostos. Aí sim, a inutilidade deste mecanismo se faz clara e presta um deserviço ao nosso adiantamento. Não que eu queira aqui julgar pura e simplesmente comportamentos, mas penso que devíamos nos valer do instrumental que a rede dispõe de maneira mais íntegra e não apenas reproduzir o que absorvemos denotivamente. A transcendência conotativa é fundamental para a linguagem constitutiva da rede e este viés psicanalítico expresso nos blogs muito me agrada. As diversas maneiras de enxergar e sentir o mundo. Multiplicidade de olhares que suscita o desejo de encontrar pessoas e não, cada vez mais, se afastar delas. Talvez este seja o ponto. Imaginar um interlocutor, mesmo que este seja invariavelmente você mesmo e vivificar o discurso obscuro de nossas almas e mentes inquietas, pululantes, desgostosas. Dar vida ao que poderíamos ser. Se ainda quisermos.


Viver sem tempos mortos, afamada concepção existencialista, não implica necessariamente em gozar de instabilidade emocional, financeira, profissional, mas sim na capacidade de se transformar, de buscar nas entrópicas crises a resignificação de si mesmo. Entender as possibilidades de revisões idiossincráticas que o blog possibilita como a panacéia ou o bálsamo para a escravidão político-filosófica a nós imposta, na qual a idéia é preterida pela imagem, talvez seja um exagero. Mas, para uma primeira experiência... sinto-me bem melhor agora.